A colônia ficava bem distante de
onde estávamos. Carregar aquela pequena alma era fácil. Nunca havia estado tão
perto de uma daquelas criações da Luz e agora, em contato com aquela criança
não conseguia deixar de perceber as agitadas impressões mentais e emocionais
gravadas em sua matriz energética. Via as cenas caóticas de suas muitas idas e
vindas entre os planos. Havia muitos momentos tristes e muitos medos
registrados... E muitos desejos também... Desejos tão simples como a companhia
de alguém ou um simples prato de comida numa vida experimentada com muita
solidão, muita carestia e a indiferença de seus iguais por seus sofrimentos! Por
fim uma morte dolorosa provocada por uma doença. Agora eu entendia porque ela
havia se matado...
Eu já havia observado esse
planeta Terra a partir da fronteira de nosso Mundo Sombrio. Conhecia as estranhas
fantasias que os seres humanos cultivam para suportarem estar naquele planeta!
Eles olham para seus campos
floridos, suas matas e florestas e vêem uma beleza e harmonia que não existe
ali. Se observassem com mais atenção e cuidado veriam as formas de vida em
todos os lugares daquele planeta envolvidas em uma perpétua batalha para se
manterem vivas. Uma guerra continuada e silenciosa onde cada um lança mão de
artifícios os mais insidiosos possíveis para matar outras formas de vida e
delas se alimentarem! Os próprios humanos vivem da morte de outras vidas,
muitas delas criadas e cultivadas por eles com esse único propósito. Se eles
prestassem mais atenção, veriam que até mesmo as plantas lutam entre si pela
sobrevivência. Como chamar tal campo de batalha sangrento de harmonioso e
belo?!
Essa alma em meus braços havia
experimentado tanto sofrimento em suas passagens por aquele planeta Terra!
Então, por que ela sempre voltava para aquele estranho mundo tão cheio de
limitações e de dor?! Por que não ir para outro planeta? Nós vemos todos os
mundos daqui das fronteiras de nosso reino e sabemos que nos outros mundos a
vida não está em guerra permanente consigo mesma.
Eram essas as reflexões que eu
fazia quando chegamos próximos de uma das muitas colônias que nossa Mãe Sombria
permitiu que fossem construídas para abrigarem essas almas perdidas de si
mesmas. Uma estranha construção essa colônia. Uma síntese dos medos que essas
almas têm de nosso mundo sombrio. Medos que deram a esse abrigo a forma de uma
cidadela cercada por um alto muro com suas torres de vigilância.
Deixei a pequena alma próxima a
uma das entradas da colônia. Dei-lhe um pequeno toque energético para que
despertasse e me afastei para as sombras próximas para observar.
Ela acordou atordoada pelo longo
contato com minhas energias. Mas antes mesmo de recuperar totalmente a lucidez,
vendo as portas no muro da cidadela já começou a pedir por ajuda. Ah, os
excessos nesses momentos de desespero destas almas. Por que elas têm de ser tão
barulhentas?!
A porta foi aberta. Curiosas e
cautelosas algumas almas foram saindo.
- Cuidado vocês aí! Um demônio
foi visto rondando por aqui faz pouco tempo!
Então eles me viram quando eu procurava pelo melhor lugar
para deixar aquela criança! Bem, ela agora era problemas deles e eu estava
ansiosa para voltar o mais rápido possível para o silêncio de minha casa, silêncio
só quebrado pelo leve sussurrar do vento nas árvores negras ou pelo som das
músicas suaves de minha flauta... Aliás, todo esse episódio me tinha inspirado
a...
- Isso tudo pode ser uma
armadilha! O demônio pode ter se disfarçado nessa menina!
O que?
- Não se preocupe Elias! Nosso
Senhor nos protege e se ela for mesmo um demônio nós vamos descobrir...
O que eles estavam fazendo?! Voltei-me
para a cidadela e me surpreendi com a cena, a criança apavorada, jogada no chão
com a maior das almas que estavam ali, um homem enorme, ajoelhado em suas
costas enquanto outros se colocavam ao redor dela apontando estranhos objetos
em sua direção.
A idéia de entrar em contato com
aqueles humanos não me agradava nem um pouco. Mas eu havia colocado aquela
menina naquela situação e sua matriz energética era tão delicada que eles
poderiam acabar com ela facilmente. Afinal, ao contrário do que os orientadores
espirituais ensinam a seus adeptos, uma alma pode sim ser destruída e eu não
iria permitir que isso acontecesse àquela alma frágil.
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